Imaginem a seguinte conversa:
- Boa noite, e da taxis Invicta?
- E sim, menina, diga la
- Olhe queria saber se tem taxis que transportem pessoas em cadeira de rodas?
- Nao, nao temos carros pra DEFICIENTES.Olhes nao leve a mal mas va mas e as paginas amarelas. POF
O POF foi o barulho do telefone a ser desligado, quando o senhor da Invita taxis resolveu por bem terminar tao agradavel conversa.
Agora imaginem que a conversa nao foi imaginada, mas sim tida por mim ontem as 9 da noite, e que o sujeitinho nao so foi tao desagradavel, como tambem me bateu o telefone no fim da chamada.
E eu fiquei a pensar. DEFICIENTE? O meu pai nao e deficiente. O meu pai ESTA hemoplegico. ESTA. Estado nao permanente, e transitivo por natureza. Porque nos, portugueses, senhores de lingua tao rica, temos dois verbos. Um SER e um ESTAR. Ha muita gente que nao tem dois verbos. E ha muita gente que nao tem um pai que esta hemoplegico. E assim, mais uma vez, fiquei a pensar porque e que me da tanta vergonha ser Portuguesa, e porque e que cada vez mais me da vergonha de ser Portuguesa. Sempre achei estranho, quando era miuda, que nunca se visse um DEFICIENTE na rua. Em Portugal nao os ha. Nao. Que vergonha, veja-se la trazer esta gente pra rua, pros outros poderem ver…. Veja-se la! E por esta atitude e que muita crianca e adulto que tem mobilidade reduzida - eu odeio a palavra deficiente, aqui deficiente mental e o gaijo da invicta, e outros que tais - dizia eu, muita crianca e adulto com mobilidade reduzida, seja ela temporaria ou permanente, pouco sai a rua. Se ja e dificil andar com carrinhos de bebe nas ruas de Lisboa (como contou a Ritit ha meses numa cronica girissima), imaginem o que e andar com uma cadeira de rodas. E por isso e que eu, e muitos de voces, crescemos sem ver outros meninos que nao tiveram a nossa sorte, porque para se moverem precisavam de uma cadeira de rodas, ou de outra coisa qualquer que os ajudasse. E e por isso que os pais desses meninos provavelmente se viram e desejaram pra tirar esses meninos de casa e lhes mostrar um bocadinho do mundo. Porque nao ha elevadores nem portas, nem casas, nem rampas, nem o caralho mais velho que e absolutamente normal no pais em que eu vivo, mas que em Portugal, essa perola, esse pais a beira mar plantado, nao ha nem se sonha. Aui basta chamar um taxi - todos eles levam cadeiras de rodas. Todos os passeios tem rampas. E assim. E uma gente esquisita e nao sociavel, sexualmente mal resolvidos, como eu costumo dizer. Mas a verdade e que aqueles meninos todos que estao num estado to complicado que nem a cabeca mexem, sao passeados todas as semanas pelo meio do Spitafields market, ali, pra eles abosrverem tudo aquilo, e pro pessoal tambem os poder absorver. Porque nem toda a gente tem duas pernas e nem toda a gente pode andar por pe proprio, e isso nao faz de ninguem menos pessoa. Excepto, claro esta, se estivermos em Portugal, onde nao, nao sao pessoas. Nao tem liberdades. Nao podem vir cheirar as flores ca fora. E e por isso que aquele senhor do Rossio - a quem chamam homem-elefante, e gozado tantas vezes por tantas pessoas. Porque este pais ja nasceu torto. E quem nasce torto, tarde ou nunca se endireita.
E no meio disto tudo, o espanto do meu homem. Mas olha la, na Holanda ha estes carros em que pagas 50 centimos e te vem levar e buscar a casa. Olha la na Holanda ha estes hospitais, Olha la na Holanda vem a casa tratar das pessoas que nao se podem mexer, lava-las etc, de certeza que ha isso em Portugal. Nao,Elvis, nao ha. Em Portugal nao ha nada disso. Em Portugal ha boa comida, algumas praias decentes, veterinarios excelentes. E politicos corruptos, primeiros ministros que se tiraram a licenciatura por correspondencia, gente descriminadora, falta de respeito pelos direitos das mulheres e criancas, falta de respeito pelos mais velhos e por aqueles que nao tem tanta mobilidade como nos, hospitais publicos de merda com medicos que se acham superiores a toda a gente e que nem sequer sabem como tratar bem os doentes do ponto de vista humano - quer ser bem tratado? Va ao veterinario* - hospitais privados carissimos, em que as coisas estao mais lim[pas, mas os medicos continuam com a arrogancia de sempre e em que as enfermeiras oferecem os servicos delas em concorrencia com o hospital, a serem efectuados no hospital e pagos a parte pelo doente (Ah, pois e!!!!).
Que belo pais esse, que e Portugal.
Agora perguntem-me la se eu quero voltar, perguntem-me?
* Ainda escrevo um dia destes sobre o excelente tratamento que se tem em Portugal nos veterinarios, porque se o servico nacional ou privado de saude fosse como os veterinarios que eu conheco, portugal estaria mais ao nivel da Holanda, ou da Suecia, ou equivalente. Anyway…
12 comentários:
pobre país o nosso.
O amigo e médico do meu pai dizia que já poucos colegas dele se sentavam na cama dos doentes. Sempre me fascinou essa expressão, carregada de humanismo. Foi sentado na cama do meu pai que ele conseguiu dar-lhe esperança e força de vontade para recuperar. Tendo o meu pai, naquela altura, uma esperança de vida de mais 5 anos, acabou por viver mais 11. Não tenho dúvida que a diferença esteve sempre no espírito de camaradagem e confiança que o nosso amigo e médico nos dava, a todos...Já não há médicos assim, é uma pena...
Infelizmente, nada disto me espanta.
Comento mais daqui a pouco, q vou entrar numa reuniao
Para não falar das mentes deficientes das pessoas que estacionam nos locais reservados a pessoas de mobilidade reduzida e grávidas por acharem naquelas cabeças distorcidas que estas pessoas têm alguma vantagem adicional. Isto faz-me ter muita vergonha de ser portuguesa.
Só para veres e seguir o teu raciocinio... o meu prédio tem 5 anos, tem 4 degraus antes da porta principal e não tem rampa. Vive um deficiente no meu prédio, tem lugar cativo, mas mesmo assim não foi feita a rampa... e mais... fizeram um prédio ao lado, igualzinho, há 2 anos e também não tem rampa... estão a fazer o 3º igual... estou para ver...
Beijoca e é merda do país que temos!
More, claro que ainda falta muito, mas já não falta tudo.
A escola das miúdas foi feita para acolher crianças em cadeiras de rodas e estas têm transporte grátis de e para casa.
E há quem vá lavar e levar comida aos acamados.
Falta muito, concordo, mas já se começou a andar.
Portugal não é comparável com país nenhum. Há tempos os taxistas tiveram formação para saber falar inglês, coisa tipo-estilo, de nível competitivo: tu disseste very-nice, eu disse let's look the lune. Eles riam-se disso. Nunca jamais levaram a coisa a sério. Bem longe dos táxis de Londres que, falando tu em crianças, tas levam onde precisares, à escola, sem que os pais precisem de ir também. Confia-se. Em Portugal? Aqui desliga-se o telefone. É mais fácil. Dá menos trabalho.
(Os exames que fizeram à minha cadela no HVet... a atenção... nem eu, que pari de forma hardcore (como diz a Repolha) num hospital central da capital.)
Concordo e fico furiosa quando vejo um lugar para deficientes em que o carrinho que o ocupa é de um deficiente não declarado. Penso que se tem vindo a melhorar nesse aspecto, devagarinho como convém a um país de brandos costumes. O que me custa mais é que as pessoas respeitem por medo e não por uma questão ética.
Aproveito desde já para te dar os parabéns. Adoro a tua franqueza e as tuas histórias, talvez por eu também ser do Porto e ter estado a viver em Londres durante 7 anos... até infelizmente me ter dado uma nóia qualquer e ter regressado. Realmente é só isso Sol, boas praias, amigos qb e boa comida (já é discutível se é saudável). Tanta é a desilusão ao fim destes 3 anos que vamos para aí outra vez :D. Um destes dias escrevo um post sobre a educação em PT e no Uk (sou Prof. e tenho 3 filhos) e aí é que vai ser descascar.
Boa Sorte e as melhoras do teu Pai.
chaosanddisorder.wordpress.com
O que dizer mais? Que estás coberta de razão?! Que assino por baixo?! Que estou contigo?!
Olha, espero que o teu pai recupere depressa!!!
(tenho saudades tuas, miúda! Quando te vejo?)
bjs
Querida CK,
Eu sou a pessoa q assinaria por baixo deste texto.
O q é pena é q as pessoas só percam 2 minutos a pensar no assunto qdo eles lhes aterra na cabeça ou no colo.
O meu irmao estudou 5 anos num colegio de freiras e so lhe disseram q havia elevador 2 anos depois de la ter chegado. "Pq o elevador era so para pessoal docente". E a minha mae a carregar com os 50 kgs do meu irmao todos os dias. Sem contar as vezes q elas se esqueciam de o ir por a fazer xixi e ja se sabe o fim da historia, certo?
Isto de gente catolica, crista, apostolica, romana.
Por isso, CK, nada me espanta.
Nao me espanta q estacionem em lugares para deficientes em parques onde ha dezenas de lugares vagos e q se aborreçam comigo pq eu chamei a policia (qq dia apanho um estalo de alguem....).
Nao me espanta q nao hajam empregos para gente q apenas tem de dificuldade a mobilidade, e q é tao ou mais inteligente q alguns especimes q eu conheço, so pq dava trabalho alterar casas de banho, p.ex..
Nao me espanta q nao hajam taxis (e eu fazia queixa a Antran q é a associaçao dos transportadores ou qq coisa assim) para transportar cadeiras de rodas.
Nao me espanta q invistam mais nos veterinarios do q nos hospitais.
Nao me espanta q a Camara Municiopal ca da terrinha ainda envie cartas ao meu irmao, q morreu ha 22 anos, a dizer q estao a criar acções a favor dos deficientes e q, se ele nao responde, entao q depois nao se venha queixar q o nome dele entre na "lista negra" (sao uns amores e uns informados, esta gente...)
Nada me espanta.
Nada.
Mas se voces ainda se espantam, façam qq coisinha e queixem-se.
Eu, e os meus, ja andamos assim pro cansado.
É verdade que a atitude desse Senhor, se é que o podemos denominar assim, foi muitissimo inadequada. Também é verdade que determinadas palavras no nosso país têm uma conotação negativa e distorcida. Contudo e não retirando a razão, não podemos generalizar a atitude de um senhor taxista para um país inteiro.
Vivo em Inglaterra e trabalho num hospital inglês, e podes não acreditar, mas miséria humana vejo eu todos os dias neste país que se diz tão avançado. Além dos idosos que acompanho diariamente na comunidade e que foram largados á sua propria sorte, embora o sistema tente colmatar as falhas que a familia deixa cravadas nestes seres humanos, a minha ou outras breves visitas de enfermeiras, apenas preenchem uns largos minutos dos seus dias. Acompanhei uma situação muito delicada de um jovem que ficou tetraplégico devido a um acidente de viação e o nhs não lhe providenciava uma cadeira de rodas para o exterior pois considera isso luxo!!! (estamos a falar de um adolescente e familia carenciada.) Coitado lá terá de se contentar em ver o mundo através da janela de casa!
Eu poderia escrever uma dissertação de Mestrado á conta das minhas vivências profissionais.
Em portugal também existem serviços públicos para apoio domiciliário e cuidados de saúde, bem como unidades de saúde familiar.
é verdade que a mentalidade é muito difícil de moldar. E é um risco comparar países tão diferentes na sua evolução histórica e social.
Também é verdade que se há muito que nos envergonhe em portugal, também o há aqui: baby P, milhares de crianças que desaparecem todos os anos (Inglaterra um dos paises da europa com mais elevado nº de desaparecimentos de crianças), gravidez na adolescência (com todas as implicações sociais, económicas e de saúde que isso acresce)...
No entanto continuo a achar revoltante a atitude do taxista, e acho que o país devia estar mais adapatado as necessidades das pessoas, independentemente das mesmas.
Nenhum país é perfeito, até porque é constituido por pessoas que são a essência da imperfeição.
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